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Marcadores de Gênero II

Considerações sobre o uso na ficção

No primeiro artigo, escrito três anos atrás, minhas observações e comparações foram basicamente sobre questões morfológicas em pronomes, adjetivos e substantivos. No atual, pretendo me envolver um pouco mais em questões semânticas. A carga simbólica e quando usar.

Antes, tenho que mencionar que de lá para cá pouco mudou, quem usa os capacitistas “x” e “@” para neutralidade continua usando, eu uso o “e” o mais que posso, já expliquei a razão no link: https://claudiadu.wordpress.com/2016/09/05/pequenas-consideracoes-sobre-os-pronomes-de-genero-x-e-i/.

O que mudou nesses três anos foi o número cada vez maior de escritores que incluem personagens diversos, mas que se concentram em pessoas binárias: trans, gays e lésbicas binárias e esquecem todas as outras letrinhas da sopa LGBT, ou mesmo as desconhecem, afinal ficar antenade demanda tempo, internet rápida, informação prévia e convenhamos que boa parcela da população não tem nada disso. Dicas sobre como construir um personagem LGBT fica para outro artigo.

Simbolismos

Profissões, cargos são majoritariamente masculinos. O empreiteiro, o diretor, o comerciante, o cientista. Para quebrar essa hegemonia masculina no comando da cadeia produtiva, podemos usar o feminino quando mencionamos profissionais no sentido geral.

“As cientistas se reuniram todas na sala de conferência à espera de um comunicado do chefe de estado. A sala estava em completo silêncio até que o responsável pelos experimentos o quebrou:

– Eu causei o problema. Por que todas estão parecem constrangidas? – perguntou Roberto.”

Na primeira leitura, para os acostumados com textos tradicionais, há uma falha de compreensão no gênero dos envolvidos. Se eram todas mulheres na sala, o que fazia Roberto no meio delas? Há tantas sutilezas de como a construção social influencia nossa percepção que precisaria de um TCC inteiro para responder essa pergunta. As perguntas aqui seriam: qual a relevância para a trama? Como lidar em outros trechos para que a leitora/leitor/leitore menos atente possa estabelecer um vínculo com a mensagem e, de alguma forma, superar a carga da construção social?

“Os cientistas se reuniram todos na sala de conferência à espera de um comunicado da chefe de estado. A sala estava em completo silêncio até que a responsável pelos experimentos o quebrou:

– Eu causei o problema. Por que todos parecem constrangidos? – perguntou Roberta.”

O segundo modo soa mais natural? Se você responder sim, precisa pensar nas razões que levaram você a achar natural generalizar no masculino e não no feminino.

Se você acha que não faz diferença, o convido (masculino mesmo) a catar coquinho.

Em ambos os textos há duas personagens com gêneros definidos e não gerais, para essas eu uso o pronome que mais respeita a identidade da pessoa: a chefe, o chefe, Roberto, Roberta. A escolha da carga indentitária dos personagens por autoras deve ser ponderada na fase de planejamento da história. A escolha dos adjetivos ou das características de personagens pode nos indicar também problemas em relação às nossas próprias razões para escrever dessa forma. Quando digo problemas me refiro às questões culturais e pessoais.

Não seria melhor escrever sempre usando um marcador neutro?

Quando conseguirmos pensar numa nova linguagem e nos livrarmos dos símbolos sexistas, pode ser. Mas ainda não vivemos esse momento, ainda vivemos numa sociedade binarista em essência. Gênero importa para muita gente, por exemplo, para o trans homem faz uma enorme diferença usar um pronome neutro no lugar de um masculino, o masculino pesa na sua luta por se ver representado, portanto fará diferença para seu personagem trans homem.

No entanto, a língua muda à medida que mudam os paradigmas, os valores da sociedade, nesse sentido a inclusão paulatina de neutralidade nas questões de gênero pode, ao longo prazo, ser um indicador de uma sociedade mais igualitária. Lembrando que só o fato de uma parcela da intelectualidade cosmopolita desejar que a linguagem neutra seja viável, não significa que a grande parcela da sociedade, que não é nem intelectualizada, nem cosmopolita (*), queira essa mudança ou no mínimo tenha ciência da possibilidade de mudança.

(*) cosmopolita no sentido em que grandes concentrações humanas em áreas centrais de metrópoles tornam as diferenças mais presentes no cotidiano e mais “normalizadas”.

Quando usar ou não usar definição de gênero

Quando for necessário, quando a definição de gênero for importante. Para uma representação feminina ou masculina, seja cis ou trans. Para as palavras que não designam pessoas: a casa, o carro, a rua, o caminho.

Quando não queremos definir personagem por gênero, quando não binárie, intersexe, egênere etc. Em 2016, Nova Iorque passou uma lei em que reconhecia 31 diferentes gêneros (há controvérsias quanto à designação de alguns), o que fazer quando a diversidade bate tão contundentemente à nossa porta? Ser o mais fiel a não conformidade de personagem.

A autora pode alternar o gênero em caso de fluído? Não vejo porque não chamar pelo masculino uma hora e noutra pelo feminino. Pode ser complicado para as leitoras no início, mas que seja, a autora se acostuma, a leitora também. Uma equação de segundo grau é um problema insolúvel para uma criança da terceira série, mas nada demais para uma aluna do último ano do ensino médio. Não subestime suas leitoras.

Usar marcadores neutros exige prática, escrever e reescrever, escolher a correta construção de frase, de palavra, para que a escrita fique clara e fluente ao mesmo tempo faça justiça às características de personagem. Substituir pronomes como ele, ela, dele, delas por diferentes construções. Substituir o generalisador eles, por pessoas, ou da/do por de. Fazer jus ao que o português nos oferece – o sujeito oculto.

“Os pedestres se assustaram com o terremoto. Eles não acreditaram que pudesse ocorrer dois no mesmo dia. A culpa era dela/dele.”

“As pessoas na rua se assustaram com o terremoto. Não acreditaram que pudesse ocorrer dois no mesmo dia. A culpa era de nome de personagem.”

Pedestres se assustaram com o terremoto. Não acreditaram que pudesse ocorrer dois no mesmo dia. A culpa era de engenheire.”

Revisão e Copidesque

Bons escritores dependem de bons revisores, é fato. Não existe revisor especializado em português que possa avaliar se seu texto contém erros em expressão neutra de gênero. O ideal é procurar e pagar um leitor beta que seja similar à pessoa retratada no seu livro/conto/poema/HQ e pedir uma leitura atenta, ou uma colega escritora que tenha familiaridade com marcadores.

Contribua

Não é nada fácil mudar a maneira de se expressar, nem possível do dia para a noite. Mas vale a pena começar a tentar, cometer erros, aprender com eles, para que um dia consigamos nos comunicar de forma mais igualitária.

Como esse é um assunto ainda em construção, qualquer sugestão será bem vinda. Vocês já usaram marcadores neutros? Qual personagem? Como funcionou para leitoras?

O QUE GOSTEI DE LER JULHO 2019

Voltando a escrever no meu blog depois de muuuiiitooo tempo. Estava no limbo, acho. Ou com preguiça, mais plausível.  Arranjei todos os livros não lidos ou que tenho vontade de reler em grupos de cinco ou seis de diferentes tipos: romance, poesia, história em quadrinhos, contos, revistas e zines, artigos. Espero dar conta de ler e comentar a maior parte.

Romance

Extemporâneo – Alexey Dodsworth – Ed. Presságio – 2016 – Físico

Nesse romance curto, o criativo Alexey amarra uma história de intersecção de realidade e multiversos. Uma pessoa acorda sempre no mesmo dia, 15 de setembro de 2015, e tirando o fato de ser um ser humano, todo o resto é diferente: o país, a realidade, o gênero e idade da pessoa muda. Acompanhamos um recorte das inúmeras faces a partir de George, um homem hétero brasileiro vivendo em Hy-Brasil, Hitler ganhou a guerra, lembrei de Philip K. Dick, e se existisse um castelo no alto do Corcovado? (não tem isso no livro, piração minha). E se nesse lugar distópico, as pessoas fossem separadas em castas, classes, cor de pele? (se bem que não é muito diferente do que se vive no Brasil atual)

A pessoa acorda para outro dia 15 e é Cassandra, uma mulher trans com poderes psíquicos. A medida que a persona de Cassandra começa a se manifestar as lembranças de George se apagam. Para combinar com a misteriosa Londres, Cassandra se envolve na investigação de um crime. Quebrando a amnésia das “vidas passadas”, Cassandra encontra registros deixados por George para que ela não o esquecesse.

No próximo e o mesmo dia 15, a pessoa é Cynthia, uma adolescente irlandesa, fã de rituais pagãos e diagnosticada esquizofrênica, que invocando a magia das runas começa a quebrar barreiras.

O quarto é o Ercole, padre de um pequeno vilarejo na Itália. Que consegue reunir as memórias dos anteriores.

Com muitas referências, filosóficas, espirituais e históricas, Alexey costura a trama através de um ponto comum entre as pessoas/personagens, a determinação de encontrar a quem se ama e manter a chama acesa para o “próximo dia”.

Rápido de ler e cativante, no entanto, me incomodou um pouco o contar a história ao invés de mostrar os acontecimentos, problema amplamente compensado pela habilidade e clareza da escrita de Alexey http://pressagio.com.br/catalogo/extemporaneo/.

História em Quadrinhos

Hacking Wave – Larissa Palmieri – Pedro Okuyama – Zaheer – Publicação Independente da Zapata Edições – HQ em Foco – 2017 – físico

Eu adoro HQs independentes, porque eles não têm compromisso estético ou mercadológico com nada. Você pode comê-los com salada, bebendo energético ou com um prato de torresmo coberto de muçarela, purê de batata, bebendo suco de graviola.

São duas histórias nesse HQ, as duas falam de inteligência artificial e controle digital. Na primeira, Sol Negro no Horizonte, destaca-se o roteiro limpo de Larissa Palmieri, que com poucos diálogos e cenas e a caneta mágica de Pedro Okuyama consegue passar uma história que mistura visual de perseguição de carros anos 90, hackers milenials, AI Black Mirror, ação no ritmo de mangás com um tema muito atual, o controle de fontes essenciais para sobrevivência humana, como a luz do sol. A atualidade do tema bateu forte na semana passada quando a Espanha proibiu o uso de painéis solares sem que haja permissão e pagamento de taxas para o governo.

Na segunda história, Faça a Evolução, os diálogos dão lugar a explicações, achei a originalidade da história muito legal, pessoas com habilidades especiais, tipo X-Men, são raptadas por empresas-governos e suas habilidades transformadas em apps. O resultado final, a amarração entre roteiro e imagem me pareceu um pouco confuso, no entanto, nada que tire a diversão/reflexão.

https://www.ugrapress.com.br/quadrinhos/brasileiros/hacking-wave/

Poesia

A Paixão Medida – Carlos Drumond de Andrade – Livraria José Olympio Editora – 4ª edição – 1983 – físico

A Corrente

Sente raiva do passado

Que o mantém acorrentado.

Sente raiva da corrente

a puxá-lo para frente

e a fazer de seu futuro

o retorno ao chão escuro

onde jaz envilecida

certa promessa de vida

de onde brotam cogumelos

venenosos, amarelos,

e encaracoladas lesmas

deglutindo-se a si mesmas.

Revista ou zine

Revista – Zine

Psycopomp Magazine – Última edição de Abril 2019, gratuita, em inglêsdigital

Li dois contos dessa edição que gostei muito, a revista traz sempre um conto com  experimentações com formatos de textos diferentes, desse  escrevo primeiro:

6.3 Synchrons by Lorraine Schein – publicado originalmente em 1995

Interessante como esse “conto” curto feito de um suposto conjunto de anotações sobre acontecimentos sincrônicos e escrito antes das grandes redes digitais faz tanto sentido hoje em dia. Também me surpreendi pensando em como sincronizar eventos em sistemas solares, galáxias diferentes, já que o tempo da Terra não se aplicaria a esses lugares. É um paradoxo, para existir sincronicidade é necessária uma linha de tempo linear com um ponto em comum, essa linha linear não existe em termos universais. Ou existe?

https://psychopompmag.com/6-3-synchrons/

Glitering Dark by Jeremy Packert Burke – publicado originalmente em 2018

Um conto para ler em voz alta, sonoro, é possível ouvir o som dos insetos, assim como as conversas das pessoas através das latas vazias. É um conto polifônico e ao mesmo tempo sinestésico. A história percorre um ano do verão ao verão, na América do Norte, o que é muito diferente do nosso clima tropical. As mudanças de humor se conectam às estações numa harmonia triste, de solidão, isolamento em um subúrbio de classe média.

O autor constrói um visual caleidoscópico e irreal, começando com brincadeira de telefone com latas, aquela em que crianças amarram barbante no fundo de duas latas para conversar a distância. No conto, as latas são carregadas por insetos multicolores durante o verão. No inverso tudo é substituído e uniformizado pela neve.

Não há como não fazer um paralelo com as nossas relações interpessoais na era das redes digitais, onde muito ouvimos e falamos, mas pouco contato físico temos um com outro. Varremos os insetos da frente de nossas casas assim como limpamos as conversas do “whatsapp”.

Então, ao final da história, mais surrealismo e encantamento, não vou dar spoilers, só posso dizer que tem ossos de baleia.

Um pedacinho como tira gosto (traduzido)

“Nós nos dirigiamos uns aos outros o melhor que podíamos, fingindo não reconhecer as vozes dos nossos padres, professores, bibliotecários e capitães da indústria, fingindo que não estamos coordenando uma infidelidade em massa. Sei que havia um tempo limitado para que a mensagem o alcançasse. Então, você teria que decidir se desejava falar comigo, ou não.”

“Nossa devoção seguiu apressada. Contamos infinitos contos de fadas, de desejos, de sexo e dons, falando ao mesmo tempo, ouvindo ao mesmo tempo, na esperança de absorver as palavras do outro, assim teríamos no que nos agarrar durante os longos meses gelados.” https://psychopompmag.com/glittering-dark/

Falando sobre a velhice

Dois contos de O Desejo de Ser Como Um Rio e Amigas Infáveis foram analisados num congresso sobre terapias complementares em gerontologia.

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Experimentação na Ficção Curta

Matsuo Basho

No lançamento do volume 1 da Trasgo, revista especializada em ficção especulativa, fantasia e ficção científica, fui convidade a participar de uma mesa redonda com o editor Rodrigo Van Kampen e a escritora e amiga Karen Alvares. O propósito inicial da mesa era falar sobre experimentação na ficção curta, mas abrimos o leque da discussão e acabamos falando sobre mercado editorial, experiências de publicação em editoras e independente etc., conduzindo a conversa de acordo com a audiência. Infelizmente eu tinha um compromisso importante à noite e não pudemos nos alongar e falar sobre experimentação.

A ficção curta tem o tamanho ideal para testar nossos experimentos linguísticos e especulativos. Não porque seja mais simples fazer um conto do que um romance, ambos exigem de escritore um determinado tipo de comprometimento. Na ficção curta – conto, micro conto, poesia – podemos nos permitir explorar com mais liberdade, pois ela é sintética e deixa pouco espaço para escapar ao contexto, num romance, cheio de nuances e personagens, elementos que quebrem a regra podem quebrar também o ritmo da narrativa, ou serem supérfluos em relação ao todo.

Experimentar significa ir além de parecer estranho ou desconfortável. Escritore deixa de lado as convenções da língua ou da estrutura narrativa e busca alternativas para se expressar. Este desligamento diegético ou estético, no entanto, tem que servir ao propósito do conteúdo.

O ponto de partida para a disgreção é a regra. Entender a tradição literária em português, Machado, Cecília, Eça, Pessoa. Conhecer sua narrativa, suas metáforas, o posicionamento social e cultural, a forma, para então desafiar as convenções. Na narrativa não-experimental, e escritore se atenta ao cenário, à construção de personagens multi dimensionais, à descrição vívida da ação, aos diálogos marcantes e identificáveis, referências culturais e transformações aplicadas aos personagens, ação ou cenário. A ligação com a “realidade” é mais contundente, exige-se uma suspensão de descrença e uma verossimilhança que coloquem e leitore na pele do protagonista.

Na narrativa experimental, e escritore tende a ser mais metafísico, mental e emocional, a “realidade”, como apontada no parágrafo anterior, raramente é organizada e limpa. A escrita é descontinuada, fragmentária, com elementos gráficos, personagens sem contornos ou identidade. E leitore é levade a interagir diretamente com o texto, não se trata mais de ser transportade e viver a vida do personagem, mas investigar a si mesmo dentro do contexto. Provocar uma sensação, mais do que a compreensão da narrativa, e leitore se questiona através dela.

Indico a leitura do conto 73 do Jogo da Amarelinha de Júlio Cortazar (contista obrigatório), para entender como é ser levade à sensação de parafuso sendo apertado pelo ritmo e escolha das palavras, analisar o porquê da escolha simbólica do autor. Décio Pignatari, Guimarães Rosa, Jorge Luís Borges, são experimentadores que, assim como Cortazar, já se tornaram clássicos. Será que podemos desafiar os desafiadores?

A pergunta a se fazer para verificar a experimentação no texto é a contra-experimentação. O que sobra se tirarmos os elementos experimentais? A experiência desviou-se ou diluiu a ideia inicial? Há elementos clássicos interagindo com o texto? Quais? Qual a importância destes elementos?

Algumas experimentações são menos metafísicas e mais diretas, como o uso de marcadores neutros de gênero que desafia a norma culta da escrita, ou diálogos com o formato de mensagem em redes sociais, narrativa não-linear etc. O próprio nome já diz que vamos fazer da nossa escrita um laboratório de testes, jentar e falhar várias vezes até acertar, ou não, pode resolver jogar fora e voltar-se para outro projeto. Mesmo quando ao ler o texto tiver a sensação de desafio às convenções, precisará ainda perguntar o propósito de querer desafiá-las e se conseguiu atingir sua intenção inicial, não para si mesmo, óbvio, para e leitore. Afinal, experimental não quer dizer ser hermético, voltado para o próprio umbigo. Compartilhamos experiências para torná-las úteis.

Exemplos

Na revista Psychopomp, gratuita, o texto da brasileira Beatriz L. Seeleander está em formato de questionário, a última pergunta (tradução minha):

15. Fim

  • a) o fim?
  • b) seguido de cinco livros com o spin-off da série
  • c) a morte é o único fim, as outras histórias foram ideologicamente editadas
  • d) não existe nada para se começar. Isso é ficção

Narrativa não-linear, o autor Fábio Fernandes narra uma história sobre amor de forma fragmentária na edição 11 da revista Trasgo. Amor: Uma Arqueologia.  , pode ser lido gratuitamente.

Personagens sem contornos e interferências gráficas na poesia e prosa da autora Adriana Versiani dos Anjos, A Física dos Beatles, Contos dos Dias, A Lâmina que Matou meu Pai.

How to Contemplate the World From The Detroit House of Correction and Begin My Life Over Again da autora Joyce Carol Oates.

 

Links para meus escritos – não experimentais 🙂

gratuito

Editora Draco

Amazon

 

 

 

 

 

 

 

 

Descrevendo um boi

bOI

Como começar a descrever um boi? Dando a ele o nome de boi.

Abro as abas dos dicionários, livros, sites de pesquisa e de imagens antes de começar a escrever. Sei que precisarei recorrer para buscar a palavra adequada, verificar uma referência, me inspirar. O dicionário de sinônimos é um dos sites usados pelos escritores, afinal é um erro repetir, um vício de linguagem.

O português é uma língua rica, mas de nomes esquecidos. Uma características dos nativos de língua inglesa é a fascinação pelos sinônimos, por aprender outras formas de dizer as mesmas palavras. Na escola há competições de spelling bee, os competidores precisam conhecer palavras incomuns, as pessoas jogam scrabble, um jogo em que o que conta é o tamanho do vocabulário. Além do fato do inglês ser uma mistura de várias línguas que eram usadas em concomitância antes da consolidação do idioma.

O mesmo não acontece com o português, nossa cultura é diferente, não damos tanto valor ao estabelecido. Há quem ache importante não deixar o vernáculo morrer, há quem discuta que a língua é um organismo vivo e deixemos que viva com liberdade, se recrie a partir do hoje. Nós somos pródigos em cunhar palavras, regionalismos, nomes próprios. Será que Guimarães Rosa seria Guimarães Rosa se não fosse brasileiro? Lógico que um bom conhecimento do vernáculo é importante para o escritor, não precisa ser só isso no entanto.

Com a massiva difusão de livros de nativos de língua inglesa, ou que são traduzidos para o português através do original em inglês, o tradutor se depara com termos que se usados literalmente ficariam assim: “tinha um brilho brilhoso”, ou “tinha um brilho rutilante”, o primeiro é uma redundância, o segundo pode estar mais próximo do original, mas provoca uma pausa na leitura ou pode não fazer sentido ao público ao qual se destina. Óbvio que um ou outro termo menos comum é interessante para se colocar num livro. O leitor aumenta seu vocabulário. Como dizer que o rio coleava ao invés de serpenteava. Mas não em todas as linhas, em todos os parágrafos, ou a leitura ficará cansativa e desinteressante.

O que isso tem a ver com dar nomes aos oxen, digo, bois. Palavras generalizantes ou com significados distorcidos são usadas para evitar redundância ou causar a tal “estranheza”. A história causa estranheza, as palavras mal colocadas causam desinteresse do leitor. O escritor em português, amador, iniciante, muitas vezes usa o termo generalizante quando quer falar do específico, por exemplo, por causa dos manuais de RPG e livros mal traduzidos ou porque, ao invés de mudar a estrutura da frase, prefere usar uma palavra que pretenda deixar o leitor em suspense e que, na verdade, leva o leitor a suspender a leitura.

  1. “Pelo contorno da figura, podia-se dizer que era uma pessoa”.
  2. “A figura lançou um coquetel molotov em direção ao tanque”.
  3. “Ela tinha uma bela figura, expressão confiante no rosto e andar seguro”.

No caso do número um, a redundância de contorno e figura. “O contorno de uma pessoa, podia-se dizer”.

No caso número dois falta clareza, a primeira acepção da palavra figura não significa a forma de uma pessoa, refere-se à forma de qualquer corpo ou ser, uma barata, um alienígena. A não ser que seja isto mesmo, que o autor esteja se referindo a uma criatura fantástica ou desconhecida, a palavra é inadequada. Um ser humano jogou o coquetel molotov, então é preferível dar nomes aos bois. “A pessoa/Uma pessoa/Um sujeito/A manifestante lançou um coquetel molotov em direção ao tanque.” No terceiro caso está claro que a palavra figura se refere à segunda acepção da palavra, aparência de alguém.

“O castelo apareceu por entre as brumas da manhã. Os muros altos, cujas paredes eram feitas de pedra, cercavam a cidade e protegiam a construção no seu centro”.

Fica melhor assim:

“A névoa da manhã se dissipava. As torres ficaram visíveis e, em seguida, a muralha de pedra que protegia o castelo e a cidade ao seu redor”.

Se a escolha da palavra não está ligada ao ritmo dentro da sentença/parágrafo, sensação de não inclusão ao ambiente ou ao nome do lugar/pessoa, o ideal é que usemos a palavra mais comum, neste caso névoa é melhor do que bruma. Já uma muralha é um muro alto espesso geralmente feito de pedras. Por fim, se o castelo estava atrás dos muros, não foi ele que apareceu primeiro, foram as suas torres ou as torres de vigilância da própria muralha.

“A criatura se aproximou com suas oito patas e um corpo gigantesco e monstruoso. Fumaça saia de suas narinas.”

Se é um monstro, deixe claro na primeira menção. Fumaça não é a palavra certa, a não ser que se trate de um dragão. Seria interessante economizar adjetivos e descrever com metáforas, mas não vou usar no exemplo, só colocar um pouco de tempero para melhorar o resultado:

“O monstro se aproximava. Quando uma das oito patas gigantescas tocava o chão, as paredes tremiam. A criatura arfava de raiva, um bafo quente e podre.”

Procure a palavra certa, coloque na ordem certa de importância. Seja direto, simples e claro. Vocabulário inadequado ou escasso, faz com que a nossa ideia chegue distorcida ou não chegue ao leitor. Por outro lado, ter um vocabulário muito amplo não significa que dominaremos a língua, precisamos saber como usar as palavras numa frase, ter noção de conjunto, ritmo etc.

Links de outros artigos que falam do uso das palavras.

A Inconfundível Clareza do Ser – Dicas para o escritor iniciante – 18

IMERSÃO – EXPLORANDO OS CINCO SENTIDOS – DICAS PARA O ESCRITOR INICIANTE 31

A Força da Palavra – Dicas Para o Escritor Iniciante 17

Reino Sem Fim – RPG e ficção escrita – Dicas para o escritor iniciante 24

NINGUÉM É OBRIGADO A LER SEU LIVRO

Leitura Crítica

Primeiro dia na casa nova. Que sensação incrível a de começar uma nova vida! Depois de carregar todas as caixas e tralhas para dentro, você deita no colchão que ainda está embrulhado em plástico e, enquanto descansa, pensa onde colocar suas coisas. Sensação parecida a de quando vem à sua mente uma ideia para um livro ou conto novo e você começa a planejar como escrever.

Os próximos dias, semanas serão de intenso trabalho, desempacotando, limpando, colocando móveis no lugar, limpando, organizando as coisas nos armários, limpando. Isso se você pegou férias no trabalho. Se precisa trabalhar, seus finais de semana deixarão de existir por um ou dois meses. Com prazer você vê sua casa nova ganhando forma. Obervar o desenrolar da sua história, o desenrolar de personagens não é diferente. Aquele móvel não cabe nesta parede, aquele parágrafo fica melhor na página seguinte. Aquele abajur não combina com nada é melhor dar embora, aquele diálogo não tem importância é melhor eliminar.

Casa pronta você chama amigues para um almoço. Mostra a casa, abre os armários novos da cozinha. E começam os palpites.

Por que você não coloca o fogão do lado da pia no lugar do aparador?

Se você mudar a cama para o lado que bate sol, evitaria problemas de ácaros no colchão, sabia?

As paredes da sala, você podia pintar de bege?

A não ser que você seja uma pessoa muito teimosa rejeitará todos os conselhos que lhe derem. Afinal, é prático ter o fogão ao lado da pia. Colchões e travesseiros precisam tomar sol de vez em quando. Bege, bege não, ninguém merece. Seus amigos são os leitores betas, aqueles que dão palpites de como melhorar seu texto.

Entrou um dinheiro extra, férias, 13o. Vamos reformar a casa para ficar nos trinques. Você contratara uma arquiteta, é caro, mas vale a pena, ela fará você economizar um bom dinheiro na reforma, talvez mais do que os 5 ou 10% que normalmente cobra. Esta é a função da leitura crítica. Especialista que analisará o ambiente em que se passa sua história, avaliará os espaços necessários para cada parte e personagem, se o material tem o volume necessário, principalmente a quem você quer agradar ou fazer se interessar pelo seu livro. Como você gostaria que as pessoas percebessem a história, confortável ou desafiadora, clássica ou conceitual.

Por fim, a decoração. Aquele cantinho que está escuro ganhará um abajur, a parede da sala um quadro novo. Aquele tapete de crochê horroroso será um bom presente para a pessoa que gosta de paredes beges. Revisor-copidesquista, uma pessoa que vale por duas, dará o toque final para que tudo fique lindo.

Você não sai pela rua convidando gente estranha para sua casa nova, chama a primeira arquiteta ou pedreira da lista do Google. Como escolher amigues e profissionais para palpitar o seu livro?

O que esperar da leitura beta?

Primeiro e mais importante. NINGUÉM É OBRIGADE A LER SEU LIVRO.

Segundo, porque ninguém é obrigado a ler seu livro, melhor contar com amigues, pessoas próximas, se possível colegas escritores. Quatro ou cinco leitores betas são interessantes, porque pelo menos dois darão retorno.

Devo estabelecer prazo para leitura?

Se você for escritore com editora e tiver um prazo de entrega não tem como não marcar uma data fixa. Você precisará de tempo também para a leitura crítica e a revisão.

Se não existir um prazo de entrega, estabeleça um prazo flexível, mas limitado, dois a três meses para um livro, duas a três semanas para um conto. Você pode perguntar se não é muito tempo. Não, porque leitores betas tem outras coisas para fazer e estão fazendo um favor, então seja paciente.

Como cobrar a leitura beta dos meus amigues?

Com muita educação e gentileza, sendo direto e curto na formulação. Não deixe as pessoas desconfortáveis com explicações detalhadas do motivo de precisar com urgência saber o que pensam sobre a “obra prima” que escreveu. Cobre duas vezes no máximo e esqueça, seu amigue teve outras coisa para fazer, não foi desta vez que poderá te ajudar, agradeça a oferta mesmo assim porque NINGUÉM É OBRIGADO A LER SEU LIVRO.

O que esperar de uma leitura beta?

Há betas revisores, que apontarão erros gramaticais e de sintaxe além de fazer uma avaliação breve do seu trabalho.

Há betas comentaristas, que criarão balões de comentários a cada parágrafo.

Há betas resenhistas, que farão uma resenha do livro/conto com introdução, dois parágrafos e conclusão.

Há betas leitores críticos, que analisarão as falhas e farão um resumão das possíveis mudanças.

Há betas concises, escreverão um parágrafo sobre o que acharam e só.

E misturades, beta que revisa e critica, beta que faz resenha e análise etc.

Qual o melhor? TODOS.

Nesta fase é bom ter quantos palpites conseguir, betas com diferentes abordagens ajudam ainda mais. Se precisar de avaliações extras, pois não sentiu que foram suficientes, procure por novos betas.

Agradeça muito, sempre, porque NINGUÉM É OBRIGADO A LER SEU LIVRO E GOSTAR.

Como seguir as sugestões

Antes de rejeitar um palpite que você não gostou, pense bem, reflita, reescreva. Se não gosta de parede da sala bege, não pinte.

Por último, ofereça para retribuir o favor lendo o texto de amigues.

Como escolher Análise Crítica e Revisão

Primeiro. Leitura crítica é um serviço pago, então pode ser cobrado dentro do prazo. A data da entrega do relatório deve ser discutida entre as partes.

Uma boa forma de encontrar ajuda profissional é pedir indicações de amigues escritores e perguntar como foi a resposta recebida.

Cada profissional tem seu jeito. Um relatório geral faz parte do serviço, às vezes detalhado por tópicos como estrutura narrativa, personagens etc., outras a preferência é por incluir estas observações como comentários dentro do texto.

Envie para o revisor uma cópia do arquivo, o bom revisor nunca altera o seu texto, ele faz marcações como letras em cores diferentes e tachados para apontar falhas e sugerir mudanças. Não corrija no texto revisado, faça também uma cópia com a revisão e passe a limpo.  

Evite profissionais não-profissionais, que não tenham carreira na área, ou formação, há muitos charlatões infelizmente. Como aquele prime decoradore que resolveu fazer um curso de decoração no youtube e agora cobra para dar palpites não muito diferentes do tapete bege.

Pesquise, pergunte, afinal é o seu dinheiro.

Mais sobre leitura crítica e revisão nestes links:

Como fazer a revisão de um texto (1)

https://www.wattpad.com/188142087-quero-ser-escritor-20-o-rascunho-1-revis%C3%A3o-e

https://www.wattpad.com/193587897-quero-ser-escritor-21-rascunho-2-leitura-cr%C3%ADtica

As pessoas não entendem o que escrevo então f$¨*-%#

Por que ter trabalho e dor de cabeça com leitores betas, revisores, leitores? Se apresentar para as editoras e for aceite elas cuidarão desta parte. Você decidiu se autopublicar, portanto quando o livro for lido e resenhado receberá sugestões para melhorar e pode publicar uma segunda edição, enquanto isso ganha dinheiro, não gasta.

1- Para ser escolhido por uma editora que pague pelo seu texto(*), ele precisa se destacar e muito, porque a concorrência é grande, além de outros profissionais de qualidade, a aspirante ainda enfrenta escritores com QI, youtubers etc.

2 – O mercado editorial brasileiro é pequeno e você pode acabar se queimando com os agentes literários por causa da falta de cuidado.

3 – Há um mar de blogueiros e vlogueiros literários, os que têm mais acessos cobram caro, dinheiro, além de marcadores e livros. E se o retorno for negativo? Como fará para se recuperar emocionalmente das críticas.

4 – Auto publicação não é desmérito, mas o cuidado deve ser redobrado, já que não terá um editor por perto para aconselhar.

(*) O contrário não é decente, ninguém deve pagar para editoras, editoras pagam ao autor não o contrário, as Vanity Presses são só gráficas que fazem uso de corretor automático.  Link de um podcast muito esperto que fará aspirante a escritore ficar esperte também.

CabulosoCast #179 – As Armadilhas Editoriais

Não precisa chorar, não foi de propósito

Não leve o trabalho dos profissionais para o lado pessoal, seja tão profissional quanto eles, analise as sugestões e dicas e faça as mudanças necessárias para melhorar seu texto. Tire proveito do dinheiro gasto. Se necessário deixe derrubar a parede e faça uma nova, lide com o entulho.

PAGOU PARA OUVIR CRÍTICAS, AGUENTA FIRME.

Ao fim de muito trabalho e caçambas de tijolos e azulejos, sua casa ficou perfeita, do jeito que você sempre sonhou. Seu livro ficou uma maravilha e não há cartão de crédito que pague pela sensação de um trabalho bem feito.
PS.: Agradeço de joelhos todas as críticas que recebi de amigues betas e críticos. Sem elas eu não seria a escritora que sou hoje, não teria a coragem para realizar um sonho de infância às vésperas do outono de minha vida.

 

 

Bienal 2017 – A Trilha da Fantasia

Visitar a Bienal e conseguir ver tudo, selecionar um bom livro ou HQ, e gastar o que está dentro do orçamento é tarefa quase impossível. Achar as editoras bacanas, com livros e HQs legais de Fantasia, Ficção Científica e Terror consome tempo e pernas. Então resolvi fazer uma listinha de editoras, dar umas dicas de livros que podem ser encontrados por lá e comprados sem susto. Assim quando bater a culpa porque o dinheiro já era, pelo menos o leitor se sinta satisfeito com suas escolhas.

Só nacionais, os estrangeiros tem um departamento de marketing inteirinho para eles, os autores lusófonos precisam ralar muito para se sobressair no mercado.

– Ah! Mas não tem a mesma qualidade.

Só diz isso quem nunca leu um lusófono de Fantasia/FC/Terror bem escrito, bem editado, surpreendente. Se a Europa e os EUA estão interessados no que produzimos no Brasil, com nosso tempero, por que nós, que temos os livros ao nosso alcance e na nossa língua, não nos interessaríamos?

Não pensem que é fácil para as editoras valorizarem os nacionais. Os estrangeiros chegam pagos ao Brasil, os nacionais necessitam investimentos gigantes em marketing. Além de sorte para render ou pelo menos pagar-se. A grande maioria dos editores das independentes são apaixonados pelo que fazem, lutam para continuar no mercado e zerar as contas no fim do mês e então publicar bons trabalhos nacionais. Sem estes editores os HQs e livros dos autores brasileiros ficariam para sempre perdidos, seja na gaveta ou nas intermináveis listas das plataformas de e-book. Eles  fazem uma peneira rigorosa para oferecer ao seu público livros e HQs de qualidade. Sim, já li coisa ruim estrangeira, traduzida e publicada no Brasil como se fosse o último biscoito mofado do pacote que só a tradução salvou do completo desastre.

Tem uma vantagem monstro para quem visita os estandes dos nacionais. Ter um contato direto com o autor, receber marcadores e brindes, tirar selfies e, porque somos brasileiros, ganhar um abraço e uns beijinhos. Conversar sobre o universo, saber da continuação das séries etc. Impossível com os paparicados autores internacionais. Consegue imaginar George R.R. Martin trocando beijinhos e falando da continuação de As Crônicas (Uma Canção) de Gelo e Fogo?

Para prestigiar estes editores valentes e suas editoras independentes comece a Trilha no Pavilhão Verde.

  1. Siga as setas e pare nos estandes marcados com um X
  2. Converse com os autores e editores
  3. Selecione o livro
  4. Descubra um mundo novo   

 

Trilha Beinal 2017

 

Lista dos expositores com livros legais de Fantasia, Ficção Científica e Terror e de alguns livros que recomendo, tem muita coisa bacana além dos títulos que citei, vale a visita. 

Pode ser que alguém não concorde com o gênero atribuídos aos livros, mas tentei resumir usando o gênero e no máximo em três palavras, querendo saber mais sobre o livro é só acessar o site das editoras nos links.

PAVILHÃO VERDE

Devir L14

Devir é editora e distribuidora de HQs, RPG e jogos de tabuleiro

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A Bandeira do Elefante e da Arara – Fantasia heróica com folclore nacional –

Christopher Kastensmidt (embora ele seja americano, reside há 15 anos em Porto Alegre)

Shimandur – Fantasia com São Paulo como pano de fundo – Caio Alexandre Bezarias

Mistério de Deus – Terror com toques de realidade no Brasil de 1991 – Roberto de Souza Causo.

http://devir.com.br/

Jambô – M18

Editora de HQs, games e livros de fantasia

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Crônicas das Tormentas – série de coletâneas de fantasia organizada por J. M. Trevisan com grandes nomes da fantasia nacional como Raphael Draccon, Leonel Caldela, Eduardo Spohr, Rogério Saladino etc.

O Inimigo do Mundo – fantasia épica – Leonel Caldela

Passagem Para a Escuridão – fantasia grimdark – Danilo Sarcinelli

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Ich – fantasia e terror – HQ ambientada na América do Sul – Luciano Saracino, Ariel Olivetti

Lizzie Bordello e as Piratas do Espaço – ficção científica nonsense – Germana Vianna

http://jamboeditora.com.br/

Draco – M13

Só publica nacional, HQs e livros de fantasia, ficção científica e terror com qualidade.

Octopusgarden – Space Ópera Erótica – Gerson Lodi Ribeiro um dos mestres do FC nacional

Magos – 3a. coletânea de fantasia organizada pela Ana Lúcia Merege, as outras são Excalibur e Medieval

O Infinito no Meio – literatura fantástica – Priscilla Matsumoto

Space Ópera – HQ – coletânea de histórias sobre disputas espaciais.

Tempos de Sangue – Eduardo Kasse – Fantasia – 5 volumes sobre imortais e idade média.

http://editoradraco.com/

Chiado – M05

Especializada em autorxs portugueses e brasileiros

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O Labirinto dos Sonhos – Fantasia – Ema Machado

https://www.chiadoeditora.com/editora

Giz- P04

Resultado de imagemResultado de imagem para kaori giulia moonImagem relacionada

Outra editora que investe bastante no nacional

Cira e o Velho – Fantasia Histórica no Brasil – Walter Tierno

Kaori – Fantasia Nipo brasileira – Giulia Moon

A Torre Acima do Véu – Ficção Científica Distópica – Roberta Spindler

http://www.gizeditorial.com.br/

Avec – Na Aquário CL07 e New Order M19

A Avec não tem estande na Bienal este ano, mas é possível encontrar os livros e quadrinhos da editora nos estandes da Aquário e da New Order

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Le Chevalier – HQ – Stempunk – A.Z. Cordenonsi, Fred Rubim

Guanabara Real – A Alcova da Morte – Steampunk – Enéas Tavares, Nikelen Witter, A. Z. Cordenonsi

Filhos da Lua (série) – O Legado – Marcela Rossetti

PAVILHÃO AZUL

Cia das Letras – G13

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Ninguém Nasce Herói – Ficção Científica – Erick Novello

https://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=55121

Rocco G17

Resultado de imagem para As Águas Vivas não sabem de so

As Águas Vivas Não Sabem de Si –  Ficção Científica/Fantástica – Aline Valek 

https://www.rocco.com.br/o-som-em-as-aguas-vivas-nao-sabem-de-si/

Gutemberg – G 26

Resultado de imagem para Série Anomalos

Série Anomalos – Distopia Jovem Adulto – Bárbara Morais

https://grupoautentica.com.br/gutenberg/livros/a-ilha-dos-dissidentes/951

Record – E09

Resultado de imagem para Série Filhos do Éden

Filhos do Éden – Fantasia – Eduardo Spohr

http://www.record.com.br/colecoes_colecao.asp?id_colecao=217

 

Lógico que não precisa seguir a risca as estrelinhas, existem outros livros e editoras legais, senti muito por ter que deixar de lado alguns dos colegas escritores em razão da concisão. Ou por que a editora trabalha por demanda e neste artigo quis valorizar as editoras que investem no autor, afinal como disse Neil Gaiman: o dinheiro tem que fluir na direção do autor, não o contrário. Aceito sugestões para melhorar a trilha nos comentários.

 

Micro Contos – Como e Porque Escrever

flash-fiction

O que são e o que não são Micro Contos

Micro contos são narrativas muito curtas, com 300 palavras ou menos, que trazem uma história total, não parcial. Não são muito populares no Brasil, nem mesmo tem valor comercial. Então por que nós, escritores brasileiros, deveriamos perder tempo escrevendo micro contos?

Primeiro porque para o escritor qualquer forma de escrita é válida. De haicais à sagas em “n” volumes.

Escrever micro contos permite ao autor avaliar o que é importante na prosa. Trabalhar o vocabulário e escolher as palavras mais adequadas. Cortar  redundâncias e tudo o que não é essencial. O autor fica afiado na hora de escrever narrativas longas. Além do que é uma forma de arte com as palavras, um modo divertido ou profundo de contar histórias.

Precisamos saber, no entanto, o que um micro conto NÃO é: um resumo de uma história ou uma parte isolada de uma narrativa maior. Pensamentos aleatórios ou reflexões, cenários desconexos ou piadas. Ações sem contexto não são micro contos. Recortes dentro de uma narrativa maior não são micro contos.

Micro Contos são narrativas completas e como tal necessitam de enredo, elementos do arco narrativo (reviravolta, flash backs, repetições, conflitos etc.), personagens, local, tempo.

Dois micro contos e seus elementos narrativos

Assim como o conto tradicional, a linha narrativa é melhor desenvolvida se baseada em no máximo três personagens e a trama contenha elementos simples e facilmente reconhecíveis.

Acerto de Contas – Lydia Davis (considerada uma das melhores escritoras contemporâneas de narrativa curta)

 “O fato de ele não me dizer sempre a verdade faz duvidar da verdade do que ele às vezes me diz, e então tento descobrir pelos meus próprios meios se é verdade ou não o que ele está a dizer, e algumas vezes sei que não é verdade, outras vezes não sei e nunca saberei, e outras ainda, só porque ele não para de me dizer, convenço-me de que é verdade, porque não acredito que ele seja capaz de repetir tão constantemente uma mentira.”

Personagens – duas pessoas num relacionamento

Arco – estabelece a dúvida sobre o que ouve do parceiro, faz uma busca para descobrir o que é verdade, termina por convencer-se que ele às vezes não diz mentiras.

Elementos narrativos – flash back, reviravolta, conflito, repetição

Tempo – ao longo do relacionamento.

Arquíloco – séc. VII a.C.

Algum saio (guerreiro da tribo inimiga) do escudo se orgulha. Sem querer abandonei a arma num arbusto. Salvei minha vida, que me importa o escudo? Perca-se: conseguirei outro igual.

Personagens – Arquíloco e o saio

Arco – perdeu o escudo, salvou a própria vida, eliminou o arrependimento

Elementos narrativos – flash back, suspense, conflito, repetição

Tempo – durante uma batalha

Local – no campo de batalha

Dicas para escrever micro contos

  1. Mostre não conte, este conselho essencial para qualquer narrativa, deve ser seguido à risca para as narrativas curtas.
  2. Atenha-se ao que faz uma narrativa interessante, conflito, cenário, atmosfera, personagens, enredo
  3. Escreva e reescreva sua história diversas vezes, quantas forem necessárias, até que ela só mostre o essencial.
  4. Comece pelo meio, pela parte mais importante ou mais emocionante. Forneça uma guia da história ao leitor.
  5. Escolha o melhor título possível, ele fará parte da narrativa
  6. Deixe um questionamento na última linha que conduza o leitor a reler o conto para entender a mensagem. Ou seja, leve o leitor por um caminho e o empurre para outro.
  7. Coloque a conclusão no meio da história.

Neste link, Lydia Davi conta sobre seu processo criativo e mostra como um dos seus contos foi escrito. Do rascunho ao final.

 

http://www.theatlantic.com/magazine/archive/2014/07/lydia-daviss-very-short-stories/372286/

Pontuação de Diálogos -(“) desculpou-se por interromper (“).

A shelf filled with books

O pedreiro levantou a parede da cozinha, a da pia. Instalações hidráulicas e elétricas precisam ser feitas, para permitir a passagem dos conduites e canos. Se você contratou um empreiteiro ou arquiteto ele vai fazer uma análise da praticidade das instalações antes mesmo de levantar a parede. Se não, prepare-se para algumas dores de cabeça e despesas desnecessárias com reformas assim que a obra ficar pronta.

A pontuação dos diálogos é este buraco por onde passarão os verbos dicendi ou outra informação que deixe claro quem está falando. Dependendo de como você usa a pontuação ela pode facilitar ou dificultar a leitura, acrescentar elementos novos ou deixar o leitor desconfortável.

Outras informações sobre como fazer ou não fazer um diálogo estão nesta outra postagem (Diálogos e seus Dramas (ou seriam Comédias?) – Dicas Para o Escritor Iniciante – 16

Diálogos

Regras Para Pontuar o Diálogos.

Para as regras você pode consultar também gramática. No entanto, são as nuances que fazem a pontuação importante. Para começar, há duas formas básicas.

LATINA

– Muito maior – acrescentou o outro.

INGLESA

“Pobre pequena”, ela sussurrou.

OUTROS MODELOS

Com vírgulas separando o verbo dicendi

– Você está lindo, disse ela, esquece-me inteiramente. (Machado de Assis, D. Casmurro)

Com aspas retas, o correto nas línguas latinas

“Você está lindo”, disse ela, “esquece-me inteiramente”.

Com aspas simples, inglês séc. XIX

‘Ele vai e vem cristão’, disse ela. (C. Dickens – Oliver Twist)

Aspas inserindo o diálogo dentro do corpo do parágrafo

Pree permaneceu em pé na grama embaixo das árvores. “É isso que os Imortais já fizeram por você?” perguntou desacreditado, assim que a viu.  (G. R. R. Martin, Game of Thrones)

Travessões separando o sujeito do predicado ou de outras partes da mesma sentença.

– Nada – eu sopro – é menos seguro que a palavra divina, Eva. (Paul Valery, A Serpente e o Pensar)

Com verbos acendi:

Ela acrescentou com os olhos, que brilhavam extraordinariamente:

– Seremos felizes!

(Machado de Assis – D. Casmurro)

Sem dicendi ou acendi

– Séculos depois e você quer se comparar ao Angelo… – Ele fez um gesto de impaciência. (Priscilla Matsumoto, Ball Jointed Alice)

Nada ou quase nada

O texto deixa claro quem está falando e só usa dicendi ou acendi com figurantes.

Daniel Galera – Cordilheira

QUAL MODELO ESCOLHER?

Como as instalações da parede. Eu posso escolher quebrar a parede para colocar os conduites, posso usar tijolos especiais para passagem de fios, canos e instalação de tomadas, assim como fazer instalação aparentes. Tudo vai depender do estilo do proprietário, da casa, da decoração etc.

Portanto a escolha da pontuação nos diálogos está diretamente ligada ao efeito que se pretende no texto.

Olhando para o travessão e para a vírgula: o primeiro parece separar quase completamente o diálogo da ação, enquanto o segundo tem um efeito de proximidade.

Olhando para as aspas e para o travessão: as aspas parecem dar certa cumplicidade ao texto e a ação, enquanto o travessão tem um caráter mais explicativo, esclarecedor.

Quebrar a ação ao meio como no exemplo acima:

– Nada – eu sopro – é menos seguro que a palavra divina, Eva.

Traduz-se como reticências, uma pausa do locutor entre as partes das sentenças, a própria vírgula, então o uso da vírgula neste exemplo específico faria menos sentido do que o travessão.

Começar o diálogo dentro do parágrafo e continuar dentro do parágrafo pode sugerir uma interação entre cenário e diálogo, como se os personagens não pudessem se dissociar do local em que a ação acontece.

PARA ALÉM DA REGRA

Ainda podemos pensá-lo como todo o texto em primeira pessoa num diálogo consigo mesmo em que as próprias respostas fossem o parágrafo seguinte.

Tabulá-los como num poema

Entorpecido de pesados sonos.

Sonho?

Sonolento de sonhos e arbustos.

Foi sonho?

Espesso de mormaço e sonhos…

Sonhei ou…?

(Mallarme – A sesta de um fauno)

 

Ou como numa conversa em rede social

PASSA LÁ EM CASA

QUE HORAS?

DEPOIS DAS TRÊS

O Básico sobre Mostrar e Contar

Contar e Mostar

 

Este artigo foi traduzido do original escrito por Emma Darwin em seu blog The Icht of Writing Showing and Telling: The Basics.

Fale-se muito em “mostrar e não contar” porque escritores iniciantes contam demais quando eles deveriam estar mostrando. Mas é claro, como regra geral, não é tão radical a necessidade de Mostrar ao invés de Contar. Ambos têm seu valor, a chave é entender a força de cada um e usá-los de forma eficiente na sua história. Repare que nem tudo na escrita é sempre binário, na verdade, atravessa um espectro que vai do mais contado conto até a mais mostrada mostra.
Mostrar é para fazer com que o leitor sinta que está dentro da história: cheire, veja, ouça, acredite na verdade da experiência do personagem. Como John Gardner diz: “é convencendo o leitor através da realidade e do detalhe que evocamos nosso mundo imaginário sobre o que o personagem faz ou diz”, persuadimos o leitor a ler a história como se tivesse realmente acontecido, mesmo estando cientes do contrário. Significa trabalhar com a imediata reação física e emocional do personagem: a cólera que chega a seus ouvidos, o vento açoitando seu rosto, um pedinte agarrando seu casaco. Quanto mais eu explico o Mostrar, mais eu o quero chamar de Evocar.
Contar é para forrar o caminho, quando você precisa de um narrador, tanto se ele é um personagem quanto por sugestão: um narrador externo ou uma terceira pessoa. Uma informação suplementar: “era uma vez”, “um exército voluntário foi reunido”, ou “as montanhas estavam cobertas de uma fina camada de cinza vulcânica”. Colocado desta forma é só um pouco mais distante da experiência imediata de que o momento do livro trata. Quanto mais eu falo sobre Contar, mais eu quero chamar de Informar.

Contar/Informar: A temperatura caiu durante a noite e a densa geada refletia os brilhantes raios de sol.
Mostrar/Evocar: O ar da manhã penetrava o frio cortante que era faca em seu nariz e boca, deslumbrantes camadas de gelo cobriam cada broto e galho.
Contar/Informar: O homem alto era um marceneiro pleno e carregava as ferramentas de seu ofício.
Mostrar/Evocar: Um machado e um martelo pendiam de se cinto e um enxó enganchava-se ali, a unha de um de seus dedões era negra e quando ele se inclinou ela viu várias farpas e serragens presas em seus cabelos negros.
Contar/Informar: Eles estavam em pé, juntos e envolviam os braços um no outro, num abraço apaixonado, então ela percebeu que ele havia cavalgado muito para encontrá-la e, talvez, por isso estivesse tão nervoso quanto ela.
Mostrar/Evocar: Eles se agarraram no abraço e o tecido de sua jaqueta parecia desconfortável sob o seu queixo. Sua mão subiu para tocar seus cabelos, ela sentiu o cheiro do couro e dos cavalos sobre a pele de seu punho. Ele tremia.

Perceba que, embora Mostrar seja um pouco mais longo que contar, não precisa ser necessariamente assim (Link para o artigo em inglês sobre Mostrar demais) Existe situações em que deixamos assuntos mais abertos e não tão pormenorizados para que o leitor possa fazer uso da própria imaginação, (link para artigo em inglês sobre mais e menos informação). No geral, você está tentando fazer com que a experiência do mundo e do personagem ganhe vida, como se sentisse de leve o perfume deles, intenso e imediato. Mostrar é mais importante nos momentos de mudança na história, nos eventos cruciais na jornada do personagem e deve viver em nós da forma mais intensa possível, pela sua total compleição, acima de tudo, pela total evocação.

Contar/Informar: James era alto e atraente para as mulheres, sendo charmoso ao ponto delas se apaixonarem à primeira vista, elas nem imaginavam o quão pouco ele se importava com isso.
Mostrar/Evocar: Mostre-nos como é James no bar, o que ele diz, mostre-nos Anna olhando para seu rosto e vendo o amor no seu sorriso… e então mostre-nos o que ele diz, no banheiro dos homens, sobre se prevenir para que aquela garota, “Como é mesmo o nome dela? Anna?”, não descubra seu endereço.
Diálogo é basicamente Mostrar, está é a sua função, embora tenha que se ter cuidado para que

a) a voz do personagem, a maneira como fala, reflita sua personalidade e

b) não encher o diálogo de tralhas descritivas sobre o que está rolando em volta.
Pode ajudar muito pensar em termos de distância fictícia (Link para o artigo em inglês sobre distanciamento). Por enquanto, dê uma olhada nos parâmetros de distâncias, e veja como elas demonstram o espectro que vai do extremo contar até o extremo mostrar.

  1. É o inverno do ano de 1853. Um homem forte está parado do lado de fora da porta sob a tempestade de neve.
  2. Henry J. Warburton nunca se preocupou com nevascas.
  3. Henry odeia nevascas.
  4. Deus! Como ele odeia estas malditas nevascas.
  5. Neve. Sob o seu colarinho, dentro de seus sapatos, congelando e encobrindo sua alma miserável

Veja como o Contar é ótimo e explica exatamente onde estamos e o que está acontecendo. E Mostrar funciona da mesma maneira quando queremos denominar o físico e o emocional da experiência do personagem, embora não nos diga onde e quem o personagem é. Como um exercício sobre o assunto, pegue duas ou três sentenças do meio de uma história que você está tentando escrever, e reescreva-as de acordo com os cinco parâmetros de distância sugeridos por Gardner.

A sugestão Mostrar-não-Contar é também a raiz da discórdia quando se fala em que se deve evitar adjetivos e advérbios. Se você nos diz que uma casa é imponente e um personagem se aproxima nervosa e hesitantemente, não é nem de perto tão vívido quanto fornecer a sensação da experiência dele sobre a casa, fornecendo corpo ao momento.
“Ela tem que dobrar o pescoço para ver o topo do telhado e uma águia de pedra olha de volta, enquanto ela sobe degrau por degrau suas pernas doem.”
Encorpar o efeito de colocar o personagem na ação faz com queo leitor sinta junto com ele, porque a mente não reconhecesse a diferença entra o imaginário e o real durante a leitura. O que a palavra imponente nos faz sentir? O que a expressão aproxima-se nervosa tem a nos dizer na verdade?Nos informa qual o efeito, mas não evoca a experiência do personagem. Mas eu sei como é sentir meu pescoço dobrando para olhar para cima e subir escadas que parecem não terminar nunca. Mostrar/Evocar ainda nos dá outra vantagem neste exemplo. Do ponto de vista dela as águias estando apontando seus narizes na sua direção: a evocação da sua postura é filtrada através da sua própria percepção, assim ao mesmo tempo nos é dada tanto a experiência física quanto a emocional. E porque estamos cientes de que as emoções são dela, sabemos que pode não ser tudo a se dizer (alguém pode ver as águias de forma positiva como se curvando num sinal de boas-vindas, uma terceira pessoa ainda pode conjecturar de que espécie são as águias) e nosso entendimento sobre o caráter da personagem e sua experiência subjetiva ganha peso.

Um subitem de Contar, que trata também do uso de advérbios, fala sobre a inscrição do discurso propriamente dito (Link para texto em inglês sobre elocuções). Não informe que ele gritou furiosamente, evoque em palavras furiosas e ações, assim a fúria será evocada para o leitor também. Não informe que ela falou em tom de piada, escreva a piada e confie que o leitor saberá que se trata de uma gracinha do personagem. Se o discurso for tomar um caminho diferente do que pretendia, mostre o efeito que será produzido: ele foi surpreendido pela fúria que irrompeu de si mesmo ou nos outros personagens. Na verdade, mostre-nos o efeito daquela gracinha que ela disse, o que há de realmente interessante na cena: ela contou uma piada, esperou pelas risadas, ele sorriu e Granny resmungou desaprovando. Um pouco menos eficientes, são as marcações de discurso, elocuções, no sentido de mostrar o como foi dito: “ele riu, ingênuo”, “ela murmurou já sem esperanças”. Se tiver dúvidas, troque o disse ou falou por “gritou”, “chorou” quando quiser indicar volume, por exemplo.

 

Não elimine o Contar. Contar é a cobertura do terreno quando ela é necessária, tem muito valor. Que você pode colorir com a voz e o ponto de vista do seu personagem, tornar mostrável, mesmo se for só para fornecer um forro à cena.
Contar Ruim: A temperatura nos meses de novembro e dezembro era terrível, como ela percebia toda a vez que se iniciava seu dia de trabalho. No geral, o trabalho progredia, mas os cavalos sofriam com o tempo úmido. Ela esperou que ele entrasse em contato com ela, mas ele não o fez e perto do Natal ela quase persuadiu a si mesma a perder a esperança de que ele entraria em contato. Ela decidiu que de qualquer jeito celebraria o Natal e foi decorar a árvore, então, finalmente, ela ouviu o toque do celular indicando que alguém estava tentando entrar em contato com ela.

Contar Legal: Novembro virou-se em Dezembro e a trama no tricô crescia com constância, enquanto do lado de fora abaixo da sua janela os cavalos eram incomodados pela chuva. E ele ainda não ligara. Perto do Natal ela desistiu de ter esperanças. Decidiu armar a árvore mesmo assim, quando ela estava tentando enganchar a primeira bola o celular tocou.

O Personagem Conta: Novembro desaba em chuvas, sem parar, todos os dias, parecendo um único e longo final de semana, os cavalos pastavam tristonhos e eu tricotava. Sei que sempre chove nesta época, mas parecia que estava chovendo em mim, a chuva era pessoal, além disso o telefone recusava-se a tocar. Choveu Dezembro todo também e mesmo quando eu abri a caixa de enfeites de Natal não me senti melhor, neste momento o telefone tocou…

Repare que por causa do Contar a narrativa não está próxima, a distância psíquica paira entre o 2 e 3 (NT: vide acima  exemplos de distância em negrito). Quando o personagem conta pode ser 3, pois ainda oferece dados precisos, forra o terreno, mas não generaliza o número de meses e a inclemência do tempo ou a época festiva. Tudo é envelopado em aspectos físicos, tangíveis, imagináveis: o tempo marcado no crescimento do tricô, o seu estado de espírito na tristeza aparente dos cavalos sob a chuva, a erosão gradual da esperança enquanto o tricô crescia o telefone continuava mudo. Ainda há um verbo de ação atrelado ao mês, que abstrai a ideia de tempo. Embora o contar do personagem não use estruturas específicas de Contar tipo: “sempre chovia”, “não me fez sentir melhor” etc., o fato deste contar ser produto da expressão e do ponto de vista do personagem o torna mais vívido.

E quando ela atender o telefone, iremos direto para o Mostrar do personagem em ação: o que ela disse, sentiu, pensou. Generalizando, quanto mais crucial é a cena, o personagem em ação, o cenário, mais cheio de mostrar terá que ser sua escrita. A maioria das cenas principais acontecerá em tempo real, porque serão os momentos importantes de mudança, conflito, decisão e aquisição de experiência. Elas precisam e merecem ser evocadas com o máximo de vida e conteúdo possível. Como um trem: mostrando os compartimentos e os vagões enquanto passa pelo túnel, contar seria um engate forte e flexível que liga uma composição à outra.

No entanto, sempre existirá casos para condensar partes de uma cena importante: sempre existirá eventos que precisamos saber que aconteceram, momentos que precisamos dar forma à cena sem detalhes tão específicos. Momentos em que na verdade o escritor precisará ser mais direito, mais plano para deixar um pouco de espaço à imaginação do leitor. (NT: em breve traduzirei dois artigos da mesma autora que falam justamente deste tema, um deles sobre cenas de sexo e outro que explora excessos no Mostrar).

Especialmente no começo de um livro torna-se complicado balancear o mostrar e o contar de forma correta, porque por um lado você precisa envolver o leitor o mais rápido possível na vida e nos sentimentos dos personagens, fazer com que tenham carinho por eles e assim levar o leitor a querer saber mais sobre eles. Por outro lado, precisamos de uma certa quantidade de informações sobre o quê, o onde e o porquê, isso se nos preocupamos suficientemente com o leitor para fazê-lo continuar com a leitura. Se você começar no 1 é melhor inserir logo o leitor no mundo do personagem, se começar no 5, terá um monte de explicações para dar.

Uma última observação. Sempre existe a liberdade de ação para quem quiser escrever a história como fábula ou caso, gênero que usa frequentemente um contador de histórias para contá-la e a voz do narrador está presente ao longo da história. O arquetípico narrativo é parecido com o de um conto de fadas, que é quase totalmente Contar. Neste modelo, a voz do narrador é mais crítica do que em qualquer outro tipo de escrita, para manter o efeito de distanciamento o narrador nos mantem junto a ele e não com os personagens, o narrador e o que está dizendo deve ser muito mais cativante. Mas se você ler algum dos contadores modernos verá que mesmo com uma narrativa carregada de Contar ou um narrador muito presente quando bem feita não elimina a experiência física e emocional do que lemos é extremamente vívida. Isto é o que Mostrar significa quando faz uso do Contar.